
Desde 2023, o Brasil passou a contar em seu calendário com um feriado nacional no dia 20 de novembro, estabelecido pela Lei 14.759, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva naquele mesmo ano. Passados dois anos de sua oficialização, muitos ainda não sabem que a data comemora o Dia da Consciência Negra, dedicado à reflexão sobre a luta, a resistência e as contribuições da população negra na construção do Brasil.
O dia escolhido por si só já é bastante simbólico para o país, pois marca também a morte de Zumbi dos Palmares, símbolo de resistência contra a escravização e de busca pela liberdade. Mais de 100 anos após a assinatura da Lei Áurea, que marcou a abolição oficial da escravatura, a população negra ainda sofre com o racismo que se firma na ideia de uma raça superior a outra e que se manifesta desde micro agressões cotidianas até formas mais visíveis de racismo institucional.

Na opinião do superintendente do Sebrae/CE, Joaquim Cartaxo, a luta contra essas agressões passa por políticas públicas, mas também por mudanças culturais nas mais diversas áreas da sociedade. Uma destas mudanças, segundo ele, é compreender a força dos empreendedores negros para o país e o papel do empreendedorismo na mudança de vida desta população.

“Os empreendedores negros correspondem à grande maioria dos empreendedores do país. Isso por si só já é um fato que merece ser reconhecido e valorizado, mas temos que ter um olhar para este segmento, para além da geração de emprego e renda, pois o empreendedorismo também dá uma contribuição significativa para a reconstrução de narrativas culturais, políticas e socioeconômicas dos povos negros brasileiros”, destaca Cartaxo.
De acordo com dados de 2024 da Global Entrepreneurship Monitor (GEM), a principal pesquisa sobre empreendedorismo no mundo, ter o próprio negócio é o segundo maior sonho da população negra brasileira (36,9%), ficando atrás apenas do desejo de adquirir a casa própria (41,3%). Já entre os brancos, ter o próprio negócio é apenas o quarto na lista dos principais sonhos (30,9%), ficando atrás de comprar a casa própria (36,5%), viajar para o exterior (36,3%) e viajar pelo Brasil (36,1%).
Também chama atenção na mesma pesquisa, a principal motivação para começar um novo negócio entre os empreendedores negros com menos de 2 anos de atuação no mercado. 78,4% deles disse que o ato de empreender nasceu da vontade de “ganhar a vida, uma vez que os empregos são escassos”. Já para 76,7% deles, a principal motivação era “fazer a diferença no mundo”. Mesmo distintas, as duas motivações refletem os desafios enfrentados pela população negra de obter renda e ao mesmo tempo mudar a realidade da sociedade atual.
Maioria
A pesquisa o Empreendedorismo Negro, elaborada pelo Sebrae com base nos dados do quatro trimestre de 2024 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), mostra que a população negra brasileira, formada por pretos e pardos, representa 52,7% de todos os 30 milhões de donos de negócios, formais e informais, do país. No total, são 16 milhões de empreendedores negros no Brasil, número que também representa um crescimento de 31% em relação aos dados de 2012.
Destes, segundo a pesquisa, 67,4% são homens e 32,6% são mulheres; 50,4% têm entre 30 e 49 anos; 54,8% são chefes de domicílio, ou seja, os principais responsáveis pelo sustento de suas casas e 71,3% atuam nas regiões Sudeste e Nordeste. No Ceará, de acordo com os dados de 2024, 73,6% dos donos de negócios do estado são negros e 25,6% são brancos.

O estudo do Sebrae mostra que o estado possuía 881,3 mil empreendedores negros em 2024, número que sofreu um crescimento de 24,5% em relação aos dados de 2012, quando havia 708,1 mil empreendedores cearenses negros. Os dados do Ceará mostram ainda que 54,6% dos donos de negócios negros são chefes de família, que 34,4% estão no setor de Serviços e 25,9% no Comércio.
Apesar de serem maioria estes empreendedores negros cearenses enfrentam desafios, muitas vezes, superiores aos empreendedores brancos, que são manifestados, por exemplo, na diferença da renda média mensal obtidas por eles. Enquanto a renda média dos empreendedores do sexo masculino brancos é de R$ 3.203,00 mês, a dos donos de negócios negros é de R$ 1.704,00.
Renda esta que cai ainda mais quando falamos das empreendedoras negras cearenses. Segundo a pesquisa, as donas de negócios negras do estado do Ceará recebem em média uma renda mensal de R$ 1.331,00, número 41,5% inferior à renda dos empreendedores brancos do estado. Além disso, a informalidade entre os donos de negócios negros chega a 85,8% do total, já entre os brancos cai para 72,5%.
Para o superintendente do Sebrae/CE, Joaquim Cartaxo, compreender e promover o debate sobre os desafios enfrentados pelos empreendedores negros é um passo importante para alterar este cenário. “Se quisermos mudar esta realidade, precisamos aprofundar o debate e buscar soluções que ajudem a reduzir ou equacionar estas dificuldades. Além das ações de combate à discriminação racial, também é preciso pensar políticas públicas de fomento e de qualificação para os empreendedores negros e negras. Só assim, conseguiremos ter um país mais justo e solidário”.
